Saturday, February 13, 2016

ACAMPANDO NO SUL DA BAHIARaul Beber – 13/02/2016



            Seguindo de carro a partir de Salvador – BA, acampamos primeiramente na Península de Maraú. Seguindo trilhas de areia transitadas geralmente por quadriciclo ou veículos 4x4 que margeiam a costa, acessadas a partir da estrada de terra BR-030, encontramos alguns pontos de acampamento entre as praias de Saquaira, Taipu de Fora e Barra Grande. É proibido transitar com veículos pela praia, de modo que estacionamos o carro na porção vegetada, embaixo de sombras de inúmeros coqueiros e áreas abertas, com vegetação rasteira para armar duas barracas. 

 Dormimos um total de três noites sem camping e cada dia procurávamos uma nova localização entre as duas praias. Vale destacar a praia de Taipu de Fora pelas incríveis piscinas naturais, formadas na maré baixa. 








Demos sorte de viajar em lua cheia sendo possível acompanhar o nascer da lua a partir do espelho do mar e realizar boas explorações com snorkel em águas quentes, cristalinas e com profundidade variável, de 0,5m a até cerca de 5 metros ao longo de formações de corais e diversas espécies de peixes e algas. 




            Após esses dias bem próximos à natureza e longe de qualquer banho de água doce, decidimos ficar 2 dias em algum camping. Encontramos um muito bom chamado Camping Saquaira, localizado na margem direita da estrada BR-030 (de terra) sentido o sul. Lá pudemos relaxar embaixo de enormes mangueiras e também comer muitas mangas frescas e muito doces que literalmente estavam caindo de maduras. 









 Foi possível também conhecer um pouco da cultura local com o simpático casal dono do camping e acompanhar a construção de um poço para captação de água subterrânea, obtida a apenas 4m de profundidade. A península se encontra entre o Rio da Serra e o Oceano Atlântico com diversas lagoas de água doce e escura com muitos sedimentos e fundo lamoso em seu interior. A lagoa Cassange  foi cenário de um dos dias de acampamento, sendo possível surfar boas ondas na praia a sua frente (Praia de Cassange).







            Após Maraú continuamos a viagem para o distrito de Serra Grande, pertencente ao município de Ilhéus-BA. Ainda na rodovia foi possível contemplar um incrível mirante e acampamos dois dias em um camping localizado na praia na ponta do morro onde o mirante foi feito e ocorrem saltos de parapente.



           Por fim, acampamos duas noites em Cumuruxatiba, um distrito pertencente ao município de Prado no sul da Bahia. A região é turisticamente chamada de Costa das Baleias devido à migração de baleias jubarte, durante os meses de julho a novembro, que usam as águas quentes da região para reprodução e amamentação. Montamos acampamento sem camping, embaixo de grandes amendoeiras na areia da praia. 

O acesso é através da estrada que leva as pousadas da praia do Rio do Peixe. 








Próximo às barracas, na ponta esquerda da praia, é possível avistar grandes falésias pertencentes à Formação Barreiras (Bigarella, 1975; Lima, 2002), com predomínio de estratificações plano paralelas de areia, silte e argila de cores que variam de branco, amarelo a vermelho escuro, bastante alteradas. Existe muitos fragmentos de crosta ferruginosa pela praia, rolados pelos movimentos de maré de diversos tamanhos (1cm - 30cm) com porções na parte inferior da parede das falésias que mostram a fácies sedimentar pertencentes. Caminhando ao após a curva formada pela falésia é possível observar belas formações formadas pela ação intempérica do vento chuva e oceano em rochas mais arenosas e brancas, gerando formas que lembram cidades de desertos no oriente médio de cerca de 30cm. A partir de trilhas é possível acessar o topo das falésias e observar a extensa costa das baleias e também a triste observação da destruição da vegetação de encosta as falésias, o que acelera a erosão das escarpas. 




 Referências

LIMA, Carlos César Uchôa de; BOAS, Geraldo da Silva Vilas  e  BEZERRA, Francisco Hilário Rego. Faciologia e análise tectônica preliminar da Formação Barreiras no litoral sul do estado da Bahia, Brasil. Geol. USP, Sér. cient. [online]. 2006, vol.6, n.2 [citado  2016-02-13], pp. 71-80 . Disponível em: <http://ppegeo.igc.usp.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1519-874X2006000300009&lng=pt&nrm=iso>. ISSN 1519-874X.  http://dx.doi.org/10.5327/S1519-874X2006000300009.

 BIGARELLA, J. J. The Barreiras Group in Northeastern Brazil. Anais da Academia Brasileira de Ciências, v. 47, p. 365-393, 1975. Suplemento.

LIMA, C. C. U. Caracterização sedimentológica e aspectos neotectônicos do Grupo Barreiras no litoral sul do Estado da Bahia. 2002. 141 f. Tese (Doutorado) - Instituto de Geociências, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2002.


Sunday, January 24, 2016

Acampar meio à mata de restinga, frente ao mar, longe da civilização – Camping Caracol, Picinguaba (SP).

Em janeiro de 2016, retornamos ao Camping Caracol, na Praia da Fazenda, em Picinguaba, (Ubatuba, SP).
Camping Caracol em Ubatuba
Seria muito bom se tivéssemos mais opções de campings, como o Caracol (http://www.campingcaracol.com.br/), para quem procura acampar como forma de se conectar à natureza. O nome Caracol veio da proposta original, de disposição dos lotes ao redor de uma estrada em espiral, algo em parte modificado.
Há inúmeros campings bons em Ubatuba e outras localidades dessa maravilha que é o litoral SP-RJ, entrecortado de baías e costões. Mas em nenhum será encontrada a paz que se tem nesse camping.
Deve-se perguntar o porquê do litoral norte de São Paulo ser diferente do sul do Estado, caracterizado por longas e retilíneas praias, com pouco ou nenhum costão rochoso. Essa parte norte do nosso litoral, juntamente com a contígua no Rio de Janeiro, vem sofrendo ou sofreu abatimento em escala continental, por isso o mar avança no sentido da Serra do Mar e entalha, na rocha, baias e diferentes praias, ao contrário do litoral Sul de São Paulo, que vem sendo soerguido, expondo sedimentos que antes estavam no fundo do mar. É como se fosse uma gangorra gigante, com seu eixo na altura do Guarujá: o sudoeste se ergue, enquanto o nordeste se rebaixa, proporcionando essa contrastante diferença de praias.
Por se encontrar dentro do Parque Estadual da Serra do Mar, a entrada de carro no camping tem que ser autorizada previamente, por isso, é necessário agendar pelos e-mails mayli@campingcaracol.com.br e campingcaracol@gmail.com. O acesso de carros à Praia da Fazenda não é permitido e a entrada é vigiada 24h pelos seguranças do parque.
O ideal é passar dias no camping, sem sair, para entrar em sintonia com a natureza, entrar no clima de um ócio agradável e prazeroso. É tranquilizador, quase um remédio, ficar no ‘sem fazer nada’, ver as famílias com suas crianças sentadas, brincando, feito índios.
Por não ter energia elétrica, uma dificuldade é conservar alimentos, mas esperamos que o Mayr  resolva o fornecimento diário de gelo. Aí daria para ficar despreocupado, esquecer-se de usar o carro.
O Camping Caracol proporciona acampar meio às árvores e bem em frente à praia.
Para quem desejar um peixe, camarão e lula, da para adquirir perto, mas terá que ir de carro, até a Praia do Estaleiro, na Peixaria e Restaurante Raízes do Jardel, com excelente comida e atendimento.
Passa-se dias camping Caracol, sem internet, com más conexões de celular (pega bem apenas Vivo e Claro) e sem televisão, o que aumenta a disposição para leitura. A Camila e sua amiga Loli leram quatro livros cada uma em uma semana!
Sala de leitura do Camping Caracol...
Vejo com bons olhos o retorno e aumento do interesse por acampar, não como opção mais em conta de se fazer turismo, mas sim por quem procura maior contato com a natureza.
Acampar proporciona também mais contato com as pessoas, conhecer gente nova, com os mesmos interesses, o que por vezes não é proporcionado em uma pousada, onde as pessoas se trancam em seus apartamentos.

Mayr (em pé) e Eli (sentada e apontando para a câmera) – proprietários e responsáveis pela manutenção das condições especiais do camping. O bom de acampar é a possibilidade de conhecer novas pessoas, como as nossas sorridentes vizinhas.
Outra questão nova nos acampamentos, a ser revisada, é o cardápio das refeições – chega de miojo!!! Da para inovar, sim!!! E muito!
Yakissoba - uma boa opção de cardápio no acampamento.
O Camping Caracol tem uma pequena cozinha para quem não tem a sua própria, a qual está sempre limpa e organizada.
Banheiros limpos, nos feriados, onde atinge sua capacidade máxima de 180 pessoas, para as 50 quadras disponíveis, a limpeza é constante, praticamente 24 h por dia. A luz é fornecida por gerador e agradável banho quente através de aquecedor a gás. Não há energia elétrica no camping.
Mas para não dizer que não falamos, ou escrevemos, das pedras, seguem algumas informações sobre a geologia.
No canto sudoeste da Praia da Fazenda afloram rochas graníticas, que são rochas ígneas, formadas pela cristalização de quartzo, feldspato e mica, após resfriamento do magma, a dezenas de quilômetros de profundidade na crosta. Notem como os grandes blocos têm a típica forma arredondada... Sabe por quê? Não é por rolamento, pois esses blocos pouco ou nada se movimentaram.
Blocos arredondados de granito no canto sudoeste da Praia da Fazenda (Núcleo Picinguaba do Parque Estadual da Serra do Mar). Os granitos formam-se pelo resfriamento de magma, a dezenas de quilômetros de profundidade, através de cristalização lenta. Como explicar então a presença dessas rochas na superfície? Explica-se pelo contínuo e longo processo de erosão, com a remoção das rochas de cima, até o afloramento das que se encontravam em profundidade.
O granito, nessa ponta da praia, apresenta estruturas interessantes, com orientação dos minerais, principalmente as micas, na forma de dobras – é o que chamamos foliação, resultado de deformações que sofreram.
Deformações e orientação dos minerais na forma de dobras (detalhes abaixo) nos minerais do granito.

Detalhe das dobras na rocha granítica, a qual, devido às transformações, deixaria de ser um granito propriamente dito e seria melhor definido como um gnaisse, que é um granito metamorfizado, mas nem todo ele encontra-se assim, deformado.
Um olhar mais atento chamará a atenção para um corpo vertical, parecendo um muro, de rocha mais escura, verde escuro, quase preta, chamados de diques.
O corpo granítico é cortado por corpos verticais, chamados de diques, de rocha mais escura – o diabásio.
Os diques de diabásio são comuns nas regiões costeiras e ao longo da Serra do Mar e, no geral, apresentam orientação noroeste, perpendicular à toda margem da costa do Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro. Essas estruturas estão relacionadas à abertura do Oceano Atlântico e separação entre a América do Sul e África, inciada por volta de 130 milhões de anos atrás, idade provável do magmatismo do diabásio no presente dique. Com os intensos esforços tectônicos, fraturas se abriram na crosta e, através delas, subiram grandes quantidades de magma que, resfriado, originaram o diabásio.
Notem como o diabásio engloba a rocha granítica encaixante, mais antiga, o que demonstra bem o processo de magmatismo e como o material era fluido, plástico. Essa observação, aparentemente óbvia, mudou a forma de pensar a origem das rochas na Terra. Ao final do século XVIII, predominavam as ideias do alemão Abraham G. Werner (1749-1817), cujas aulas contou com a participação do santista José Bonifácio (1763-1838). Segundo Werner, grande parte das rochas do planeta tiveram origem em um imenso oceano primordial. A partir desse grande oceano, os granitos, basaltos e diabásios  teriam se precipitado e, por isso, essa teoria recebeu o nome de Neptunismo, em referência ao Deus do Mar – Neptuno. Naquela época, essa ideia, criada sem observação da natureza, de forma quase filosófica, vinda apenas das reflexões que surgiam de mentes brilhantes, teve grande aceitação pela igreja católica, por remeter à ideia do Dilúvio, apesar de Werner não fazer referência direta ao evento bíblico.
As rochas então formadas, nesse grande oceano primitivo, eram tidas como “primárias”. A ação erosiva, seguida de deposição, daria origem a outras rochas, mais novas, as secundárias. Foram encontrados sedimentos sobre as rochas secundárias, pela lógica, definidas então como terciárias, mas a observação da natureza demonstrava também a presença de sedimentos mais novos ainda, sobre os terciários, então seriam quaternários. Essa sequência de definição dos pacotes rochosos seria a explicação da definição dos termos Terciário e Quaternário na escala do Tempo Geológico. Por ter como base o Neptunismo, concepção não mais aceita hoje, os termos foram abolidos por comissões do IUGS – International Union of Geological Science e substituídos, respectivamente, por Paleógeno e Neógeno. Por pressão dos “quaternaristas” – pesquisadores que focam seus estudos nesse intervalo de tempo, o termo “Quaternário” voltou formalmente à escala do Tempo Geológico, e lá permanece.
O que é interessante na Ciência, longe dessa chegar mesmo que próxima à verdade absoluta, é a busca incessante pela mesma. A Ciência moderna tem por base hipóteses que devem ser testadas. Muitas delas sobrevivem por não existir uma melhor...Porém, a observação e a demonstração das evidências são fundamentais para suas formulações e comprovações. Como explicar então que a formação de um granito ou basalto se daria a partir da água do mar? Não havia – e não há – nenhuma evidência disso!
James Hutton, motivado por um momento especial que vivia na Escócia, conhecido como The Scottish Enligtenment, junto com outros grandes pensadores, como Adam Smith, pai da Economia Moderna, se dedicava a entender a natureza. Duas observações suas foram fundamentais para revolucionar as presentes ideias sobre a evolução geológica do planeta, motivo pelo qual ele é considerado o Pai da Geologia Moderna. Uma delas veio de suas observações de Siccar Point, na região costeira a leste de Edinburgo, na Escócia, onde resolveu, para aquele momento, questão primordial para o raciocínio geológico – a ideia do Tempo Profundo, segundo a qual, para a Terra, não teria começo e nem fim. Essa forma de pensar foi fundamental para as ideias de Darwin referentes à Seleção Natural. Outra ideia de Hutton foi a constatação de que rochas, como o granito, não seriam originadas a partir da precipitação da água do mar, como preconizava o modelo Neptunista, e sim, originada pelo resfriamento de magma nas profundezas da crosta terrestre! Formulando, assim, a nova teoria, denominada Plutonismo, com referência a Plutão – o Deus das profundezas.
A origem das rochas magmáticas (plutônicas) por resfriamento e solidificação do magma, e a intrusão em rochas mais antigas, é amplamente aceito e comprovado por inúmeras pesquisas científicas modernas. Mas aquela exposição de rochas que James Hutton observou, em suas andanças, deixava isso de forma clara, como a observada nessa ponta da praia da Fazenda.
Desenho feito por James Hutton, a partir de suas observações em Tayside (Escócia), que mostra como um corpo de rocha magmática, no caso um dique, se encaixa em rochas mais antigas, algo muito semelhante ao observado na ponta sudeste da Praia da Fazenda, perto do Camping Caracol.
Excelente vídeo da BBC sobre James Hutton, e dos locais que estudou, encontra-se disponível no endereço da internethttps://www.youtube.com/watch?v=8lsnSqYa1UU, para quem deseja conhecer mais sobre as ideias de James Hutton nos locais de seus estudos.
O diabásio, que constitui os diques que cortam rochas graníticas mais antigas da região costeira, é uma rocha que resiste menos ao intemperismo, tão intenso em nossa região tropical. A rocha alterada é mais fácil de ser erodida, por isso os rios se encaixam e certa entradas na costa se formam, como a Praia das Conchas, que tem acesso por trilha que se inicia ao lado da bica de água dessa ponta da praia da Fazenda. Seguindo por esta mesma trilha, por mais 20 minutos de caminhada, chega-se à Praia Brava da Almada, uma das mais bonitas do litoral norte paulista.
Praia das Conchas, acessível por trilha (20 minutos) a partir da bica de água da ponta sudoeste da Praia da Fazenda. Essa baía se formou pelo entalhamento de outro dique de diabásio, também de direção noroeste, rocha esta que, por se alterar mais, é mais facilmente erodida, dando origem à pequena baía e ao vale que chega nela.
No caminho para a praia das Conchas, observa-se outra estrutura parecida com o dique, só que menor e preenchida por outro material - Quartzo. Por ser menor, é chamada de veio, mas é muito semelhante ao dique.

Veios de Quartzo que cortam a rocha granítica, no caminho da praia das Conchas.
O diabásio, na praia das Conchas, apresenta uma interessante estrutura de alteração, na forma de camadas concêntricas, feito uma cebola, chamada de esfoliação esferoidal. Esse tipo de alteração ocorre devido à ação do intemperismo através das fraturas, o que torna os blocos arredondados, não pela movimentação deles, mas pela alteração, mais intensa nos vértices (onde a superfície de contato com a água é maior), intermediária das arestas e menor nas faces.
Processo de alteração do diabásio. conhecido como esfoliação esferoidal, com o aspecto acebolado da rocha, por se desfazer em “camadas”.
Através de projeto em desenvolvimento no Instituto de Geociências da USP – o Geohereditas – Núcleo de Apoio à Pesquisa em Patrimônio Geológico e Geoturismo, várias pesquisas pós-graduação vêm sendo desenvolvidas para melhor entender a evolução geológica da região costeira e divulgar essas informações para a sociedade, com treinamento de guias de turismo locais. Por meio desse projeto, logo logo, informações sobre a geologia da região serão divulgados através de painéis. Parte da geologia dessa trilha já foi divulgada (http://www.igc.usp.br/?id=661) e interpretações geológicas de outras trilhas podem ser consultadas no endereço http://www.igc.usp.br/index.php?id=616
Mas estávamos todos de férias, lemos muito, passeamos e tivemos sorte com o Sol, apenas nos últimos dias, pegamos chuvas.

Não se pode deixar de lado a oportunidade de caminhar pelas pedregosas ruas de Paraty, cada vez mais linda.




                                                              Acho que elas gostaram, não?

Dicas de trilhas em Picinguaba
http://www.ambiente.sp.gov.br/parque-serra-do-mar-nucleo-picinguaba/principais-atrativos/


Camping Caracol – Praia da Fazenda, Pinciguaba (Ubatuba, SP) Agendamento prévio pelos e-mails mayli@campingcaracol.com.br e campingcaracol@gmail.com
agradecimentos ao Prof. Elias Araujo pela revisão e sugestões.